DIAS SINGULARES: TEATRO NA ESCOLA XX

ESCURIDÃO ACESA - II
Um projecto de Gonçalo Costa interpretado pelos alunos de Artes do Espectáculo – Interpretação, da Escola Secundária D. Pedro V, Lisboa. Ensaio de 27/3/2017.

UM PALCO NOS BASTIDORES

O que vemos no palco é apenas uma pequena parte do que é feito até chegar ali. Vemos o produto final e não o processo. Assistir aos ensaios de várias peças de teatro tem-me permitido ver uma grande parte do trabalho desenvolvido para montar um espectáculo, uma história em imagens vivas. Mesmo que seja muito simples, que não é o caso presente, a preparação é longa e árdua. Por vezes, quanto mais simples parece mais complexo é o processo de construção.

Um espectáculo de sombras chinesas tem sempre duas faces, obriga o palco a desdobrar-se em dois: o palco visível, vazio de gente, repleto de sombras; e o palco oculto, repleto de gente que tenta reduzir a sua presença a sombras que se movem, agem e sentem.

Não há vozes, todo o discurso é feito de imagens, sombras que se movem na luz. E os intérpretes são obrigados a ver ambos os palcos em simultâneo, aquele em que contracenam e aquele em que são vistos contracenar. É preciso prever e ver interiormente aquilo que só o público pode ver.

Nestes espectáculos, o que o espectador vê não é o que os actores vêem. Em cada momento, vemos apenas o que se passa no pano iluminado, parece tudo limpo, delineado cuidadosamente a lápis de carvão, por vezes parece tudo vazio, as sombras foram-se e a própria vida parou. Mas o pano continua iluminado e lá atrás a azáfama continua, sem ruídos. Lá atrás o caos mistura-se com a ordem, há adereços e gente por todo o lado, gestos, sinais, olhares que vão desenrolando o fio narrativo e dando sentido ao desfilar das sombras. O caos permanece afastado do foco de luz e não é visto pelo espectador, mas é um caos necessário para que tudo flua e faça sentido.

As sombras são gente, revelam emoções como se estivessem, em carne e osso, sob as luzes do palco visível.. Há qualquer coisa muito profunda e densa nestas sombras. São desprovidas de aparências, ficam apenas os vultos humanos e um vulto pode ser qualquer um. Por isso, parecem tão inteiramente humanas e autênticas. Não é preciso distinguir entre o ser e o parecer. Elas são o que parecem porque tudo se reduz ao essencial dos acontecimentos, dos actos e das emoções.

Um trabalho bem concebido e bem interpretado. Estão todos de parabéns. Já lá vão uns meses desde que concluíram o vosso curso. Espero que não tenha sido o fim de um caminho mas apenas uma etapa muito importante no caminho de cada um.