quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

TEATRO NA ESCOLA IX

CHOVE EM BARCELONA

     O prometido é devido. Inicialmente, tinha pensado não publicar qualquer álbum sobre a peça Chove em Barcelona, de Pau Miró, porque as fotografias não saíram bem, mas uma conversa com um dos jovens actores há algumas semanas atrás fez-me mudar de ideias. Apesar da baixa qualidade das fotografias e do vídeo, aqui fica o testemunho do trabalho de final de curso de três jovens actores do Curso Profissional de Artes do Espectáculo da Escola Secundária D. Pedro V.
     Chove em Barcelona, do dramaturgo e actor catalão Pau Miró, é uma peça contemporânea sobre o quotidiano de pessoas bem reais. A acção decorre no quarto habitado por Lali, uma prostituta, e por Carlos, um proxeneta com alguns inesperados bons sentimentos. Nesse pequeno espaço, algo degradado, onde a chuva penetra sem arrefecer os sonhos, Lali coexiste com Carlos e com os clientes. Destes só um é visível na peça: David, proprietário de uma livraria, ser bisonho e angustiado pela morte anunciada da mulher que se encontra hospitalizada. Em Lali, ele encontra o contraponto da doença e da morte. Ela representa a vida, com todas as suas vicissitudes, ambições, sonhos e fantasias. Mal toca em Lali, contempla-a e conversa com ela. Age com ela como com a própria vida, coisa fugaz a que é arriscado prender-se em demasia. A vida real incomoda-o, a chuva, o canto das gaivotas. É algo que não pode controlar e que se intromete entre as suas fantasias e a consciência acutilante de que tudo na vida é frágil e fugidio.
     Lali é o antídoto desta hiperconsciência da vida. Apesar da vida marginal que leva, continua a alimentar sonhos inconquistáveis e desejos tão banais como os de saborear fast-food ou dar um passeio no parque. A coexistência com David e outros clientes do meio intelectual e universitário despertaram nela certas ambições culturais e artísticas e o gosto pela simples fruição da criatividade. Descobre o prazer da leitura e da reflexão e exercita-os com espontânea modéstia respondendo aos desafios de Carlos que lhe vai lendo aforismos escritos em invólucros de chocolates. Carlos só vê o linear e imediato. Lali voa com as palavras e tenta interpretar a seu modo os aforismos.
     Não são de facto comportamentos habituais em prostitutas e proxenetas. Carlos serve-se deste exercício de exegese como um modo de se elevar intelectualmente aos olhos de Lali, que admira David pela sua inteligência e cultura. Carlos não é apenas um proxeneta; a seu modo ama Lali e sente em relação a David uma espécie de ciúme ou pelo menos um certo complexo de inferioridade. Como precisa do dinheiro que Lali ganha vendendo o corpo, acaba por aceitar coexistir com David. Não são nem nunca serão amigos. Ambos precisam de Lali por motivos diferentes; David precisa dela para afogar as mágoas e evadir-se de uma vida angustiante; Carlos precisa dela para sobreviver por dentro e por fora.
     O quarto de Lali fica situado no bairro Raval, antigo bairro Chino de Barcelona, onde se cruzam classes, modos de vida, culturas e etnias muito diferentes. É um bairro boémio e algo marginal que atrai também gente da classe média-alta que aí encontra o exotismo necessário para satisfazer os seus caprichos. Decerto modo, David é um desses homens abastados que procura preencher o vazio da sua vida. Mais do que a morte iminente da mulher, a causa da sua angústia e melancolia parece ser o tédio e o vazio que nem toda a literatura contida na sua livraria pode preencher. Na verdade, choca até a indiferença com que se refere à morte próxima da mulher, como se fosse um peso de que quer livrar-se. Não ousa fazê-lo; aguarda que a morte o faça. Incomoda também o desagrado com que ouve o canto das gaivotas. Segundo ele, trazem-lhe más memórias (uma agressão inesperada de uma gaivota quando era criança). Parece antes o queixume de quem está habituado a ordenar tudo na vida, até a própria Natureza. Consciente e inconscientemente, a doença fatal da mulher lembra-lhe que não tem o poder de ordenar nada. Pode apenas pagar os serviços de Lali e alhear-se por alguns momentos da dura realidade.
     A distribuição dos papéis (David é representado por uma jovem actriz) acrescenta à encenação nuances que não se encontravam no texto. É impossível não pensar que o ciúme de Carlos não se dirige a outro homem mas a uma mulher. Se Carlos não pode igualar o “David homem”, ainda pode menos suplantar ou substituir o “David mulher”. Claro que esta distribuição de papéis foi imposta pela constituição do grupo de jovens actores (um rapaz e duas raparigas), mas acaba mesmo por alterar a perspectiva inicial do texto. Seja como for, todos os três jovens actores representaram os seus papéis com grande coerência. A dose de ambiguidade que permanece não empobrece o texto, confere-lhe apenas mais uma perspectiva e possibilidade de interpretação.
     O fundo absolutamente negro do cenário não foi propício às fotografias, onde o contraste luz-sombra é muitas vezes excessivo, mas funcionou muitíssimo bem como elemento criador de uma atmosfera onde o sonho e a realidade chocam e coexistem. As agruras da vida lá estão naquele fundo negro; mas os sonhos e a esperança também estão lá nas cores vivas e quentes das roupas da cama, do cortinado florido e na própria indumentária de Lali, que muda constantemente de “pele”, como se mudar de aparência fosse também um modo de mudar a vida.

     Os jovens actores e a encenadora (Mariana Rosário) estão de parabéns. Este será certamente mais um daqueles momentos que todos irão recordar na galeria de muitos outros momentos dos três anos de trabalho árduo e dedicado. Qualquer que seja o caminho que sigam, continuem a fazer o que fazem e farão com dedicação e prazer! 






It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

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 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

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It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

 It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

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It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

It's Raining in Barcelona, photography by São Ludovino.

        

domingo, 30 de novembro de 2014

TEATRO NA ESCOLA VIII

BETWEEN STAGES – ENTRE PALCOS

     Tencionava terminar os posts sobre “Teatro na Escola” do ano lectivo de 2013-2014 com uma compilação de fotografias sobre os momentos que antecedem e sucedem as representações. Os momentos em que se montam e desmontam os cenários, se preparam os adereços, se experimenta a aparelhagem de som e luz, os momentos de concentração e preparação, os ensaios rápidos, as últimas orientações dos professores / encenadores, a troca de impressões e análise do trabalho feito, o que correu melhor ou o que esteve menos bem. Foi isso que tentei fazer com o vídeo e o álbum de fotografias que se segue.
     Desta experiência resultou uma visão nova do teatro e das pessoas que o fazem. Professores / encenadores e alunos / actores cooperam de forma estreita. O espírito de cooperação e entre-ajuda é constante e generoso. Claro que há espírito de competição, mas regra geral prevalece o espírito de auto-exigência. Cada um tenta dar o melhor de si mesmo no seu próprio trabalho e ainda lhes resta energia e dedicação para apoiar os outros. Sabe bem vê-los agir assim e ainda por cima quase sempre com uma alegria e boa-disposição transbordantes. Se algo falha ou corre mal, lá vem uma voz amiga, um abraço para dar ânimo e fazer melhor na próxima vez. Aos meus olhos correu tudo muito bem. Cada um deu o melhor de si, ou pelo menos deu o melhor desse momento… e há sempre momentos melhores e piores.
     Todos os cenários que vi montar e desmontar deram muito trabalho, mas impressionaram-me sobretudo os cenários das peças “Num Dia Igual aos Outros” (de John Kolvenbach) e “Loucos Por Amor” (de Sam Shepard), pela riqueza dos detalhes e pela forma como funcionaram como espelho perfeito dos actos e emoções. Parte da atmosfera foi criada por aqueles cenários, pelas luzes e som. O Teatro é de facto um conjunto complexo de modos e instrumentos de comunicação e é preciso cuidar de todos para que tudo resulte da melhor maneira.
     O que vi e senti durante esses dias fez aumentar ainda mais a minha admiração por esses jovens actores e pelos seus professores / encenadores. Espero que cada um consiga seguir aquele que é o melhor caminho de cada um. Cada um tem características diferentes, mas todos possuem a semente essencial: o talento e um grande amor pelo Teatro. Estou certa de que bem cedo voltarei a ver alguns deles sobre um qualquer palco… Para aqueles que se candidataram ao Conservatório e entraram, os meus sinceros parabéns sem nenhuma surpresa… Eu sabia que conseguiam. Aos outros, apenas digo e repito: não desistam nunca, vocês têm a semente; só é preciso fazê-la germinar e cuidar sempre dessa plantinha que crescerá e dará muitos frutos. Além do mais, todos conhecemos as contingências da vida. Se num dia não correu tudo bem, noutro correrá melhor. E aqueles que avaliam e seleccionam às vezes também se enganam… porque às vezes vêem apenas aquele instante e não todo o potencial que ficou calado…
     Este não será contudo o último post relativo ao ano de 2013-2014. No próximo mês, farei ainda um post sobre a peça “Chove em Barcelona” (de Pau Miró). Devo isso ao Gonçalo Silva (que há poucos dias foi falar comigo sobre este assunto), à Andreia e à Sara. Só que as fotografias não saíram como eu desejava e o álbum será necessariamente pequeno.
     Quanto à peça “Um Pedido de Casamento” (de Anton Tchekhov) — a única peça que não me foi permitido fotografar —, não farei nenhum post, mas no álbum “Between Stages” constam várias fotografias do ensaio rápido que precedeu a representação. Rita, Alexandre e Mariana, desculpem-me… Sei que por vossa vontade teria fotografado a vossa peça, mas como sabem essa decisão não me cabe a mim e eu tento não infringir as regras.

      O trabalho do presente ano lectivo (2014-2015) está já em andamento. Desde que seja autorizada a fotografar as peças que estão em preparação, continuarei a fazer estes posts sobre “Teatro na Escola”. Desejo as maiores felicidades e um excelente trabalho a todos: àqueles que concluíram o curso anterior (12.º ano), àqueles que estão agora no segundo ano do curso (11.º ano) e aos recém-chegados (10.º ano). 



Between Stages, photography by São Ludovino.

Between Stages, photography by São Ludovino. 

Between Stages, photography by São Ludovino. 

Between Stages, photography by São Ludovino. 

 Between Stages, photography by São Ludovino.

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 Between Stages, photography by São Ludovino.

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Between Stages, photography by São Ludovino. 

Between Stages, photography by São Ludovino.

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 Between Stages, photography by São Ludovino.

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Between Stages, photography by São Ludovino.